Nos meses que precederam a estreia de Despertar da Força, certamente, tu deves ter tomado ciência ou mesmo participado de alguma maratona de Star Wars. Quem sabe, até chegou a discutir em rodas de amigos uma forma inusitada de rever – ou, vá lá, conhecer – a franquia. Fato é que ninguém, pouco importa se fã ou neófito, conseguiu passar incólume da coqueluche instalada por Rey, Finn, Poe ou Kylo que praticamente anulou qualquer “distância” daquela Galáxia muito, muito distante. Quer dizer, “Luke Skywalker” é agora um tiozão zen-budista que mora aqui ao lado, e vive se metendo em lances nova era, espíritas, etc.
Star Wars nunca deixou de ser popular, mas se era possível propagar ainda mais sua notoriedade, a Disney o vem fazendo de maneiras elogiáveis e – vamos lá, hora de polemizar! – e mesmo superiores aos ideários de George Lucas. Parece o clássico caso do “filho” que toma às rédeas do negócio de família e acaba realizando algo que não está apenas à altura dos feitos do “pai”, mas também implementa modificações estruturais que serão determinantes para a prosperidade do estabelecimento nos anos vindouros. O problema é que, por mais amistosa que pareça, não tem jeito, essa transição sempre renderá sorrisos amarelos, elogios cinzentos e puxões de orelha desmerecidos.
Da última vez que tecemos algumas linhas sobre esse admirável “Novo Universo Expandido”, tratamos dos primeiros arcos das histórias em quadrinhos advindas dessa parceria com a Marvel Comics, que começaram há exatamente um ano. Hoje, gostaria de ir mais afundo nessa expansão conceitual, mas dessa vez a partir do Best Seller que acaba de chegar às estantes do mercado livreiro, Star Wars: Marcas da Guerra, de Chuck Wendig.
Cronologicamente, o presente romance tem seu lugar cerca de três meses após a Batalha de Endor (Episódio VI) e vem a ser o primeiro capítulo de uma trilogia chamada “Aftermath” – e não, não recebeu uma tradução por parte da Editora Aleph, que cuida da edição nacional. O foco aqui, contudo, não é no trio Luke, Han¹ e Léia, mas sim nos primeiros momentos da frágil Nova República, tentando recolher os cacos que restaram dos sistemas da Orla Interior ou Exterior, completamente exauridos ou marginalizados em vinte e poucos anos de Império Galáctico. Essa infinidade de alocações, que mescla planetas consagrados com outros inéditos, nunca antes citados na mitologia, por sinal, já desvelam uma ausência de cunho organizacional que facilitaria horrores a leitura, e se repete em todos outros romances da franquia: um mapa estelar da Galáxia muito, muito distante.
¹ Embora Han e Chewbacca protagonizem um conto interlúdio que, muito provavelmente, será desenvolvido na segunda parte da trilogia Aftermath.
¹ Embora Han e Chewbacca protagonizem um conto interlúdio que, muito provavelmente, será desenvolvido na segunda parte da trilogia Aftermath.
O recurso cartográfico é bem conhecido dos entusiastas da Terra Média, Westeros e, até do nosso bem recente "Marciano Simpático", e serve como bússola para o leitor, mantendo um certo senso de localização naqueles mundos ficcionais. Algo que, portanto, só viria para acrescer a experiência de imersão no livro, não importando em decréscimos na qualidade do texto de Wendig.
Ah, e que texto: são cerca de 400 páginas, lidas como um passeio no hiperespaço. O autor em comento cria uma narrativa que racionaliza aspectos da saga, apenas tangenciados nos sete filmes, mas nunca verdadeiramente aprofundados como, por exemplo: dos anéis interiores aos recônditos inexpressivos da galáxia, qual foi a verdadeira influência do jugo de Palpatine? O que seria um Império após a morte de seu Imperador, e quem o controlaria agora? A proposta libertária da Nova República, ainda que benfazeja, teria cacife suficiente para unificar sistemas que testemunharam o surgimento de um déspota a partir do próprio sistema que a Aliança Rebelde está tentando ressuscitar?
As respostas para essas e outras questões surgem quase que de soslaio à medida que somos apresentados aos personagens centrais da trama, quais sejam:
Ah, e que texto: são cerca de 400 páginas, lidas como um passeio no hiperespaço. O autor em comento cria uma narrativa que racionaliza aspectos da saga, apenas tangenciados nos sete filmes, mas nunca verdadeiramente aprofundados como, por exemplo: dos anéis interiores aos recônditos inexpressivos da galáxia, qual foi a verdadeira influência do jugo de Palpatine? O que seria um Império após a morte de seu Imperador, e quem o controlaria agora? A proposta libertária da Nova República, ainda que benfazeja, teria cacife suficiente para unificar sistemas que testemunharam o surgimento de um déspota a partir do próprio sistema que a Aliança Rebelde está tentando ressuscitar?
As respostas para essas e outras questões surgem quase que de soslaio à medida que somos apresentados aos personagens centrais da trama, quais sejam:
Wedge Antilles, Norra Wexley, Temmin "Snap" Wexley, Senhor Ossudo, Sinjir Rath Velus, Jas Emari e Rae Sloane. |
A experiência de se pilotar um Tie Fighter. |
² Isso mesmo, Temmin Wexley é o "Snap Wexley" que você viu em O Despertar da Força.
Sinjir Vath Velus é - ou era - um "agente de lealdade", o equivalente a oficial da "corregedoria" dos militares do Império, que vendo a balança pendendo para a Aliança em Endor, abandona sua farda na mata daquela lua para vestir o traje de um rebelde morto em combate. O desertor, contudo, não é lá um mau sujeito; apenas um como tantos outros que foram absorvidos pela máquina, ante a escassez de opções num sistema que fulminava qualquer pensamento individual.
Jas Emari é uma Zabrak, que decidiu seguir os passos de sua tia Sugi, uma Caçadora de Recompensas nas Guerras Clônicas, conhecida por cumprir contratos que, geralmente, descambavam para causas nobres. E nada mais nobre que fuzilar imperiais, não é? Por outro lado, ao perceber que o seu alvo primário estava prestes a se reunir com a cúpula do Império, sentiu que estava sentada sob uma pilha de créditos da Nova República. Teria, portanto, que tirar o dedo do gatilho e repensar o plano.
E é a partir desse mote que esses personagens, em algum momento, entrarão em rota de colisão com os interesses da Almirante Rae Sloane, uma "serpente" que visa transformar uma conferência de "cobras criadas" em algo que legitime sua agenda de poder:
Entrementes, tal como ocorreu com Rey em O Despertar da Força, é interessante notar em Marcas da Guerra o protagonismo feminino assumindo cada vez mais às rédeas na Star Wars Pós-Disney. E isso fica bem evidente na construção de Norra, Jas, Sloane e até em outras histórias como, por exemplo, no Novo Amanhecer de John Jackson Miller, com Hera e Zaluna; na Missão do Contrabandista de Greg Rucka, com Alecia Beck; ou, quem sabe, na vindoura personagem de Felicity Jones em Rogue One.
Mas claro, a obra em comento está muito longe de ser algo meramente ativista ou panfletário; não, a missão de Chuck Wendig aqui é deveras importante, e trabalha nas entrelinhas raciocínios que levam o leitor a construir mentalmente os alicerces de certas subtramas do filme de J. J. Abrams, a exemplo do alvorecer da Primeira Ordem como um suposto resultado da desmilitarização da Nova República.
O que me leva a uma analogia que esteve gritando comigo durante toda a leitura: substitua a Nova República pelas Doze Colônias de Kobol; e a Primeira Ordem pelos Cylons, e podemos enxergar o "novo" status quo de Star Wars como uma releitura do enredo de Battlestar Galactica, inclusive se refletirmos sobre o também longo interregno em que os seres sintéticos se ocultaram dos humanos: 40 anos.
Dá o que pensar, hã?! |
4 comentários:
E um post avaliando a linha de quadrinhos um ano depois? Uma boa ahahahaha
Abraço o/
Olá, Do Vale! Não está fora dos meus planos. Deixa acabar Vader Down que a gente conversa, ok?
Outro universo no qual preciso me aprofundar. Clone Wars já passou em brancas nuvens, acho bom começar logo a dar a uma chance a Rebels.
Marlo, se puder, acompanhe as excelentes mensais de SW pela Marvel. Como ambas as séries (Star Wars e Darth Vader) ainda estão bem no começo (#3), dá para correr atrás do prejuízo. Coisa finíssima, e a vantagem de os mixes terem 100% de aproveitamento.
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