sexta-feira, 24 de julho de 2015

Limites Estabelecidos

A melhor maneira de encerrar uma disputa territorial entre dois povos, antes mesmo de seu estopim, é mapeando seus respectivos limites:
 Sabe aquela sensação de urgência em que tu temes que a qualquer momento a casa vai cair, mas tu sequer suspeitas quando ou onde isso acontecerá? 

The Walking Dead #144¹ não lhe soterra com uma casa. Provavelmente com um Burj Khalifa

¹ Será que devo retirar o que disse naquela vez? Tudo vai depender da reação do nosso estimado líder.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Pregos

Há precisos dezessete anos, Alan Davis roteirizou e ilustrou um conto que se tornou bastante emblemático entre a miríade de possibilidades imaginadas durante a trajetória do selo Túnel do Tempo (Elseworld): O Prego. Inspirado no poema homônimo de George Herbert, o quadrinho trazia a conjectura de que um desses cravos de metal furou o pneu da camionete dos Kent e impediu que eles viessem a encontrar o último bebê de uma civilização extinta. 

Sem a concretização desse fato histórico no Universo DC, tudo que acontece a seguir converge para um cenário mais pessimista, inclusive, para a própria Liga da Justiça.

"E assim, um reino foi perdido [...]."
"E assim, [outro] reino foi perdido [...]."
Contudo, esse artifício da inversão de paradigmas e supressão de elementos canônicos não foi uma exclusividade de Davis, na realidade, não foram poucas as equipes criativas que apostaram em “e se(s)” para entregar narrativas fora da zona de conforto da continuidade. Red Son, de Mark Millar, Dave Johnson e Kilian Plunkett, por exemplo, idealiza a conjectura geopolítica de um mundo em que a cápsula de fuga de Kal-El caiu em uma fazenda comunitária da União Soviética, dando um rumo bastante distinto às práticas imperialistas no século XX.
 Ou, quem sabe, o subestimado, Poder Absoluto (Superman/Batman #14-18), de Jeph Loeb e Carlos Pacheco, em que os vilões do século XXXI, Lorde Relâmpago, Rainha Satúrnia e Rei Cósmico, viajam ao passado e alteram a linha do tempo, assassinando tanto os Kent quanto Joe Chill nos momentos que definiriam as vidas de Clark e Bruce. Em paralelo, o trio inviabiliza a Era dos Heróis, exterminando Barry Allen, Hal Jordan, Jonn Jonzz e Arthur Curry, em momentos igualmente cruciais. Criados como irmãos, Clark e Bruce tornam-se déspotas globais de uma utopia em que nada escapa ao seu controle (sumário), sobretudo, os focos de resistência de vigilantes uniformizados.
 E é nessas vãs tentativas dos insurgentes de se livrarem dos dois irmãos que Poder Absoluto fica guardada na memória, em especial destaque, a partir dos confrontos com Oliver Queen; ou com Boston Brand, que se incorpora no Kryptoniano, aproveitando-se de sua vulnerabilidade à magia, só para ser exorcizado e aprisionado pelo Cavaleiro das Trevas a partir de um encantamento da falecida, Zatanna; e, claro, contra uma curiosa versão dos Combatentes da Liberdade¹ capitaneada por Tio Sam e Diana.
 E há também a representação de circunstâncias improváveis como uma “Gotham sem Batman”, na qual Bruce Wayne nunca perdeu seus pais e é de fato o playboy milionário que finge ser no mundo real; ou, quem sabe, na homenagem de Loeb ao clássico de Alan Moore, O Que Aconteceu com o Homem de Aço.

Nascida para ser Pin-Up.
 ¹ Cujo recrutamento reserva momentos surpreendentes como o chamado da stripper Sandra Knight, a Lady Fantasma, ou a passagem em que Sam e a amazona localizam a espaçonave de Abin Sur.
 Liga da Justiça: Deuses e Monstros, dirigido por Sam Liu e escrito por Alan Burnett e Bruce Timm, tal como o Prego de Davis, Red Son de Millar ou o Poder Absoluto de Loeb, aposta também em inversões inusitadas de perspectivas, que acabam entregando, por que não, uma terra paralela intrigante e novinha em folha ao Multiverso DC. Por outro lado, diferente dos correspondentes citados, o desenrolar de Deuses e Monstros traz consigo um panorama em que os alter-egos da Trindade DCnauta nem sequer são os que imaginamos que sejam, trazendo, portanto, uma dinâmica inusitada, pontuada por tons adultos, e muito próxima da liberdade criativa de um trabalho autoral. 

E isso é tudo o que posso dizer sem estragar sua experiência, haja vista que o grande divertimento aqui reside exatamente na associação de conceitos e personagens do universo corriqueiro. 

Portanto, proceda por sua conta e risco

“SUPERMAN” 


O chute no balde começa quando Jor-El é impedido de inserir sua matriz genética na de Lara, o que nas vias normais viria a conceber Kal no shuttle a caminho da Terra. Nessa versão, Zod obsta a consumação do ato num espécime de estupro ideológico, implantando seu material genético naquela genitora. Portanto, o último rebento de Krypton é progênie de Zod e Lara, mas as mudanças não param por aí:

Nascido de uma dedada?
Na minha ótica, a variante mais relevante se dá quando a criança refugiada é encontrada e criada por um casal de imigrantes ilegais mexicanos. Quer dizer, se o Superman original é considerado como o “imigrante definitivo”, em Deuses e Monstros ele é "duplamente definitivo”:

El último hijo.
Batizado como Hernan Guerra, suas origem tanto biológica quanto adotiva passa a repercutir significativamente nas visões de mundo desse Superman que, a propósito, é mais pragmático, cirúrgico e moralmente suscetível a medidas extremas. Hernan seria, portanto, uma versão light de seu genitor:

Nunca um "bebedor de leite®, só puro malte Kryptoniano: Gold Label?
 Antes do lançamento do filme animado, três microepisódios de seis minutos dirigidos por Bruce Timm foram disponibilizados na web, cada qual focado em um dos vértices da referida trinca. O que decorre em “Bomb” é bastante similar ao contexto do antológico “Epilogue”, contudo, com a licença poética do Senhor Guerra

“BATMAN” 


Se pensar direitinho, Kirk Langstrom, o outrora “Morcego-Humano”, parecia mesmo um nome razoável para o vampiro que se autointitula como o Batman. Do mesmo modo que sua contraparte original, a pesquisa de Kirk se dirige a aplicações médicas da fisiologia quiróptera, contudo, nessa história, sugere-se que o personagem sofre de linfoma e o seu objeto de estudo viria para dar um fim ao seu sofrimento. Ledo engano, ao testar a fórmula final em si próprio, o resultado que chega é o de uma condição similar...

...ao do Dr. Michael Morbius?
No seu microepisódio, “Twisted”, Kirk localiza o esconderijo e abatedouro de um assassino(a) serial, enfrentando-o logo em seguida. Em certos aspectos, esse Batman parece um primo carrancudo de Terry McGinnis, sobretudo no layout da indumentária, mas isso é tudo. Kirk é silente e soturno, o que casa totalmente com o modo distante, quase cínico, que Michael C. Hallo “Dexter” em pessoa – imposta sua voz.

Que maravilha de geladeira, hã? Será que tem alguma Sul Americana por aqui?

“MULHER-MARAVILHA” 


De themysciriana, Bekka não tem nada, na verdade, trata-se de uma personagem criada por Jack Kirby no panteão de Novos Deuses do Quarto Mundo. Naquela conjuntura, a personagem era filha de Himoninventor que, ao lado de Metron, criou as Caixas Maternas e Tubos de Explosão – e se insurgia contra a opressão de Darkseid em Apokolips, tendo como principal aliado, Orion, filho do tirano, que mais tarde viria se tornar seu marido. 

Um tanto esquecida da continuidade pelas equipes criativas contemporâneas, em 2007 no arco Tormento (Superman/Batman #37-42), Alan Burnett, roteirista de Deuses e Monstros, reapresentou Bekka num inusitado team-up com Batman, tendo como missão o resgate do Superman de um planeta imaginário conhecido como Tártaro, reduto no qual o Homem de Aço vinha sendo mantido prisioneiro por Desaad.

Com mão boba e Sem mão boba...
Se sem saber de nada o morcego faz estrago, imagine só quando ele souber de tudo...
Faz sentido o design do elmo de Orion...
Durante a missão, ela e Bruce mantêm um caso, mas no seu desfecho, mesmo visivelmente apaixonada pelo Cavaleiro das Trevas, decide regressar ao seu status quo ante, acreditando que o tempo arrefeceria aquela paixão avassaladora. 

Em Deuses e Monstros, para selar a paz entre Nova Gênese e Apokolips, Izaya, o Pai Celestial, negocia o matrimônio de sua neta, Bekka, com Orion. De início, ela esperava um noivo arredio e bruto, mas o breve tempo juntos a fez se afeiçoar pelo mesmo. Porém, no dia do casamento, a verdade vem à tona: tudo não passava de um ardil de Nova Gênese para aniquilar toda a família real apokolipsiana e seus principais tenentes

Sei o que está pensando: “casamento vermelho”, não é?
 Arrependida por ter tomado parte na armadilha, Bekka abandona os seus e decide construir outra vida, bem longe do passado recente. No microepisódio dela, “Big”, nossa “Mulher-Maravilha” nos revela que a melhor maneira de finalizar uma sequência de hit combos, é assumindo a dianteira:
  Em tempo... 

A julgar pela qualidade da trama principal, o sucesso de público e crítica, é bem certo que num futuro próximo voltaremos a ter notícias dessa trindade improvável. Nos quadrinhos, inclusive, foram lançados prelúdios por J. M. DeMatteis e Bruce Timm, como proposta de expansão daquele universo, quais sejam: Superman Fallen, Batman Hunger, Wonder Woman The Dream, Justice League Genesis.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Tirando do Plástico #5

Tive "três revelações" após tirar o plástico do meu exemplar de Demolidor Revelado:
 (1) Várias páginas internas vieram com problemas de impressão, algumas escurecidas e outras com balões de diálogo "sujos" ou desfocados.
 (2) Amparado pelo Art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, ingressei com um pedido de troca junto a Amazon BR e, para minha surpresa, vejam qual foi a resposta do SAC:
 Pois bem, como podem perceber, a opção da Amazon BR quanto a produtos defeituosos é de apenas ressarcir o cliente dos valores pagos. Quer dizer, a simples permuta de um produto viciado por outro despido de vícios, garantida por lei federal, é negada ao consumidor segundo o argumento tacanho de que a "loja brasileira não tem um sistema de troca".

Posto isso, passei 35 minutos no telefone, informando a um colaborador e seu supervisor que gostaria de fazer valer o meu direito de consumidor, trocando meu álbum tolhiço por outro sem os erros mencionados. Resultado: a Amazon BR se sobrepõe a norma consumerista por mera burocracia interna, negando ao consumidor um direito dos mais básicos do CDC.

Ainda assim, me foi dada a opção de ficar com o exemplar e receber um desconto de 90%, o que prontamente recusei, afinal, o que está em jogo não é o preciosismo de ter consigo uma edição impecável ou a cifra que foi paga: sim, um erro de tal monta incomoda - e muito! -, e quanto ao que se pagou pelo livro, sabe-se que o valor sentimental inerente a uma obra dessas perpassa a oferta e a procura passageira, transformando-se, sabe-se lá o porquê, em um monstro alimentado pela inércia das editoras e especuladores de ocasião. 

No caso de Demolidor: Revelado, uma edição cujo estoque de primeira tiragem já foi pelos ares, é questão de tempo até que os Mercenários Livres começem a afiar suas armas brancas. 

(3) A bola está agora com a Panini. Liguei para o SAC da editora e me foi recomendado relatar o fato e anexar as fotos das páginas em questão enviando-lhes um e-mail ao "atendimento.cliente@panini.com.br". 

Foi o que fiz. Sigo agora ainda mais apreensivo, uma vez que o pós-venda da Panini é errático e historicamente problemático - por outro lado, já foi pior

De todo modo, os trinta dias estão correndo e se o pior cenário de fato se concretizar, quer dizer, não conseguir efetuar a troca da minha edição defeituosa, ingressarei com uma demanda no Juizado Especial local

Exagero? De minha parte, nenhum. 

Leitor de quadrinhos tem que deixar de ser sangue de barata e se entender como um consumidor valioso de uma indústria cultural cada vez mais ascendente, que merece respeito e se dê ao respeito, exigindo suas contrapartidas. Isto é, manutenção de preços contratualmente pactuados, continuidade de coleções previamente anunciadas, regularidade na reposição de edições esgotadas ou, como no meu caso, um pós-venda célere e respeitoso.

terça-feira, 14 de julho de 2015

“Família é Tudo”


Oderint Dum Metuant - "Que me odeiem, contanto que me temam." Palavras tiradas do poeta Attius e citadas por Cícero em um de seus famosos discursos. Se aplicam às autoridades prepotentes e desconfiadas.


É também o lema da Família Carlyle.

Lazarus provavelmente passou despercebido pela grande maioria dos leitores de quadrinhos aqui no Brasil. Primeiro porque ainda não foi publicado por aqui. Segundo: comparado com as mega ultra sagas revolucionárias, Lazarus é um material bem low profile.  Por último, talvez você até tenha lido, mas certamente não foi atrás do processo criativo, os bastidores da produção.

É aí que figura o lado mais interessante de Lazarus. 

A história, criada por Greg Rucka,  narra um futuro próximo onde 1% da população controla 99% dos recursos mundiais, enquanto 99% do restante da população sobrevive com o 1% disponível. Essa minoria dominante está dividida em grupos econômicos familiares que controlam o destino do restante da população, abolindo governos e fronteiras.



Cada Família possui ainda um representante extraordinário, denominados Lazari, que defendem os interesses do clã. Cada Lazarus é "melhorado" usando os aprimoramentos comerciais da família, como implante cibernéticos ou engenharia genética. A série foca inicialmente o Lazarus da família Carlyle, a humana geneticamente modificada Forever.

Lançado em 2013 como série regular (com algumas paradas merecidas para tomar fôlego), Lazarus foi descrito na época do seu lançamento como “O Poderoso Chefão encontra Filhos da Esperança”. Ingredientes fortes e consagrados, argumento mais que suficiente para deixar este que vos fala escreve de orelha em pé. Mesmo assim demorei para ir atrás, mas dei muita sorte de achar as 10 primeiras edições separadas com um ótimo preço. Digo isso porque li não só a história, mas o canal de comunicação transparente que Rucka abriu na sessão de cartas.



Rucka explica como foi o lampejo inicial para criar esse universo, o contato com Michael Lark, ex-parceiro de Gotham Central, e a tentativa de emular o embasamento científico das obras de Warren Ellis. Inclusive, numa demonstração encantadora de humildade, Greg Rucka comenta que procurou Ellis e pediu uma orientação técnica, em busca de embasamento científico.

Como o Velho Bastardo deve ser um imenso boa praça, direcionou o amigo de profissão para o conceito de célula tronco embrionárias de pluripotência induzida (pesquise por IPS e fique embasbacado) o que resultou na capacidade de regeneração de Forever Carlyle.

Mais desse interessante processo criativo, você encontra na wiki da série.



Rucka e Lark não pararam por aí. A cada edição da revista, uma nova pesquisa ou teoria cientifica é apresentada. O simples esboço de um quarto ou um veículo militar tem um embasamento real. A sessão de cartas serve também como veículo para divulgação científica, mostrando quão próximo estamos daquela realidade. Ainda sobra espaço para complementar as informações históricas, cronologia e descritivo das empresas/famílias que controlam o mundo. Por isso mesmo, recomendo a leitura das edições avulsas da série.

Com um foco tão grande no Worldbuilding, a trama fica um pouco amarrada nos primeiros números. No segundo arco,já é possível ver uma situação onde os "Restos" da população tem uma chance de ser promovidos a Servos. O terceiro, Conclave, traz uma reunião de todas as Famílias e seus respectivos Lazari, apresentando melhor a dinâmica política desse Novo Mundo.

Lazarus tem tudo para sair do papel e ganhar uma adaptação em breve. Os rumores já começaram, e algumas atrizes já estão fazendo o costumeiro lobby para o papel. Quem saiu na frente, e possui uma semelhança inegável, é a atriz Michelle Rodriguez. Além de ser uma boa atriz em cenas de ação, Rodriguez parece realmente gostar da série.



...

Vladimir Putin indicaria: O cafezinho no final daquela refeição. Uma dica saideira. Se Greg Rucka tentou emular Warren Ellis, agora é a vez do Velho Bastardo arriscar uma prosa bastante parecida com o texto noir urbano de Rucka no livro Máquina de Armas

A trama envolve um caso de polícia, um mistério digno do interesse do leitor, várias armas, um psicopata com alucinações e um ritmo ágil e muito agradável de leitura. Lembra muito o romance A Queima Roupa do Rucka, só que é o WARREN ELLIS escrevendo.

Não se assuste que não tem figurinhas, é uma ótima leitura.


sábado, 11 de julho de 2015

A Febre


"[...] é um regime de terror de um homem só."
Já tive¹ sábados piores. 

¹ E com certeza terei uma ou duas coisas para desabafar com vocês durante a semana. Aguardem!

sexta-feira, 10 de julho de 2015

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Belas Adaptações


Após alguns anos de indefinição, o famigerado projeto de levar para as telinhas o romance Deuses Americanos, de Neil Gaiman, finalmente ganhou luz verde e agora se encontra em pré-produção. A opção de entregar a adaptação às mãos do incompreendido e mal-agourado
showrunner Bryan Fuller foi corajosa e até inspirada, haja vista que dificilmente tu vês por aí direções de arte com tanta identidade, arroubos sombrios e momentos de surrealismo puro quanto à de produtos como Pushing Daisies ou Hannibal. Algo, portanto, completamente fora da curva e totalmente cabível a uma das mais belas e complexas crias do Senhor do Senhor dos Sonhos

Se Deuses Americanos vingare a torcida é grande! –, é quase certo que um punhado de outras obras de Gaiman deverão ganharm também formatos live-action. Curiosamente, um termômetro que, aparentemente, deve ter servido para que produtores-executivos avaliassem esse potencial praticamente inexplorado da prosa do autor foi a radionovela de Good Omens, veiculada pela BBC Radio em abril último.
 Good Omens (ou Belas Maldições) foi escrito a quatro mãos por Neil Gaiman e Terry Pratchett (Discworld). Publicado originalmente em 1990, só foi lançado no Brasil oito anos mais tarde pela Bertrand Brasil. Para efeitos cronológicos, pode-se dizer que foi o primeiro romance de Gaiman e narra com um humor negro ímpar a história de Adam Young, o Anticristo em pessoa, um garoto de onze anos de idade que deveria engatilhar o Apocalipse, mas como fora trocado na maternidade e criado por uma típica família britânica, tudo que ele deseja é se divertir com sua “gangue”. 

Paralelo a sina de Adam, somos apresentados a Arizaphale, o arcanjo do Portão Leste do Jardim do Éden e Crowley, a serpente que instilou Eva a morder aquela maldita maçã. Dois amigos improváveis que gostam de viver entre os humanos e têm exatos três dias para sabotar esse suposto cataclismo bíblico.
 Na contramão, querendo acelerá-lo, temos os quatro Cavaleiros do Apocalipse: Guerra é uma linda mulher que alimenta discórdia onde quer que passe; Fome é um CEO do ramo alimentício que inventou uma comida industrializada que nem engorda e tão pouco alimenta; Morte é um senhor de poucas palavras; e Poluição, que tomou o lugar de Peste após ela se aposentar em 1929 com a invenção da Penicilina

Belas Maldições é daqueles livros que você se esquece de respirar, e tal como Deuses Americanos sempre foi alvo de especulações quanto a adaptações para outras mídias.Com a participação ativa de Gaiman nos bastidores, a radionovela da BBC pulou toda a burocracia de Hollywood e acabou entregando um produto¹ que sobrepujou as limitações de um audiobook, estimulando a imaginação com boas atuações e efeitos sonoros que capturam a atenção dos ouvintes. À primeira vista parece démodé, mas o que a rádio inglesa fez foi levar os populares podcasts para outro nível²

¹ Que por acaso é também uma bela homenagem post mortem.

² Um nível muito acima de uma radiodifusão dominada por forrós, pagodes, sertanejos...
 Para promover a adaptação, a BBC Radio encomendou galerias de arte com passagens e personagens de Belas Maldições. Todas são intrigantes, mas as composições de Sean Phillips (Criminal) – reproduzidas ao longo do texto – saltam aos olhos.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Tirando do Plástico #4


A Panini parece ter aprendido uma importante lição: não era preciso sempre sufocar os leitores de encadernados com o luxo de edições definitivas e suas muitas centenas de páginas, tamanho diferenciado e outros detalhes dispensáveis. Dava pra apostar em uma linha graficamente decente, com preços convidativos e (salva de palmas!) distribuição em bancas.

Benditas as crianças escravas indonésias, que possibilitaram a realização de alguns dos sonhos mais malucos dos fãs. Quem, eu pergunto, QUEM, em sã consciência, imaginaria que, um dia, teríamos um encadernado do Aquaman (do AQUAMAN, gente!) nas bancas brasileiras? Outra coisa importante aqui: a editora percebeu que não é só clássico que vende bem e já soltou quatro caprichados encadernados da corrente fase Os Novos 52. Espero, de coração, que o retorno financeiro esteja à altura da relativa ousadia.

Mas, se for pra botar clássicos na roda, que a Panini perceba, agora, o que deveria ter feito quando da malfadada encadernação da Liga da Justiça por Grant Morrison, cujo volume 2 jamais viu a luz do dia.

O quarto encadernado d'Os Novos 52 é o segundo do Batman, dando continuidade à republicação da futuramente clássica passagem de Scott Snyder pelo principal bat-gibi. Foi com ele, A Noite das Corujas, que eu voltei pra casa hoje. Não saiu do plástico ainda, mas falta pouco. 

Sobre a história: como foi que Batman e o Garra Motherfucker conseguiram bater aquele papo tranquilo às margens de uma turbina de avião? Para mim, um mistério muito maior do que a verdadeira identidade do vilão.


Hoje também foi dia de pegar as mensais de Batman e Liga da Justiça, além de mais um capítulo de Batman Eterno.

Antes de minha viagem à Paraíba, porém, eu trouxe para meu combalido armário o 8º e o 9º volumes da fabulosa O Inescrito, sendo que o primeiro foi avidamente devorado antes de sair de casa. Esta série bem poderia se chamar O Inesperado, porque não me lembro de outra série com tantas reviravoltas de cair o queixo. Espero que o crossover com Fábulas, no volume 10, faça jus a ambas.


Last but not least, dois itens foram tirados do plástico antes de chegarem às minhas mãos, mas isso não diminui o prazer de tê-los enriquecendo minha coleção. De meus amigos Marcelo Oliveira e Daniel Arcades, ganhei um exemplar de Dogville, do polêmico Lars Von Trier, repetido em sua coleção de DVDs. Do meu colega escapista Luwig, seu encadernado de fabricação própria de O Velho Logan - e digo a vocês, o cabra tem as manhas do processo de picotar gibizinhos pra fazer um caprichado gibizão. Li, gostei e não deve demorar a pintar um review tardio, seja aqui ou no Catapop.


E os colegas, como andam justificando o assassinato de seus porquinhos?

Dois One-Shots #4: Ter e Manter & O Cavaleiro da Vingança

Para começar a semana com o pé direito, faço questão que nossos leitores escapistas limpem suas papilas gustativas e apreciem essas duas suculentas entradas: 
 Sob muitos aspectos, gosto de pensar que Ter e Manter foi a última história que li do Homem-Aranha e, provavelmente, o mais singelo conto produzido para o Amigão da Vizinhança em décadas. A história tem seu lugar no período Pós-Guerra Civil no qual Peter e Mary Jane tiveram seus dias de foragidos da justiça, o primeiro por se opor a Lei de Registro Super-Humano, e a segunda, por ser sua cúmplice.

Narrada em duas frentes, uma com a Sra. Watson-Parker na clássica lanchonete Grão de Café, sendo interceptada e assediada por um Agente da SHIELD, propondo que a mesma denuncie o marido à troco de imunidade total; e a outra, do outro lado da cidade, paralelamente, com um Peter alquebrado, negociando sua rendição com um detetive do DPNY.

Em meio a situações tão similares e, ainda assim, tão adversas, os dois rememoram a inocência de outra vida, mais simples e que valia a pena guardar para momentos como aqueles. Mais que a instituição do casamento, eu acreditava na parceria daqueles personagens. Num amor que, inclusive, tal quais todos os demais, poderia sofrer também seus reveses e, quem sabe, se desgastar ou terminar naturalmente, mas nunca em uma decisão editorial retrógrada sob a carapuça de anular-lhes magicamente seus estados civis. Ou como bem concluiu o Sérgio Codespoti, não se trata de “[...] uma questão de moralismo, mas sim um questionamento da hipocrisia marqueteira”.
 Num mundo perfeito, Peter e MJ ainda estariam ali em cima, naquele “mirante”, decidindo que passos dariam a seguir. May morreria dignamente naquela cama de hospital; alguns meses de luto e teia para cima: é para frente¹ que se anda balança

Ter e Manter², de Matt Fraction e Sal Larroca, foi publicada em Homem-Aranha #78 (Panini/2008) e, originalmente, em Sensational Spider-Man Annual #1 (2007). 

¹ Do contrário, sempre é bem-vindo uma série vintage – de outra vida – a exemplo dos saudosos Arquivos Secretos do Homem-Aranha (Untold Tales of Spider-Man), de Kurt Busiek e Pat Olliffe

² À época de seu lançamento, esse One-Shot rendeu a parceria Fraction/Larroca uma indicação ao Eisner Awards na categoria história fechada.
 Nossa segunda entrada começa com um fato notório: ninguém discute que Flashpoint deixou um rastro de destruição muito além de qualquer reconstrução no continuum DCnauta. Ponto. O que muitos desconhecem é que um spin-off dessa minissérie principal se sobressaiu ao ponto de virar sucesso de crítica e até mesmo receber uma indicação ao Eisner Awards 2012 na categoria série limitada. 

Estamos falando de O Cavaleiro da Vingança, de Brian Azzarello e Eduardo Risso, publicado no Brasil em Ponto de Ignição Especial #3 (Panini/2012) e lá fora em Flashpoint: Batman - Knight of Vengeance #1-3 (2011).

O barato desta trama é que, em algum momento, tu começas a imergir na ideia de que, se a maior tragédia super-heroica de nosso tempo não ocorreu conforme a esteira do evento original, quem diabo então seria o Batman? 
 
Trata-se de um Batman mais velho, bastante similar a versão futurista de Miller; e ainda que seja um estrategista brilhante, não se pode dizer o mesmo de suas habilidades detetivescas. Pragmático e moralmente falido, suas motivações vêm de um lugar distinto, uma Gotham diametralmente oposta a Gotham City que conhecemos. Na realidade, a resposta é bastante instintiva, mas, acredite, nada lhe prepara para o impactante desfecho dessa história.

Se deseja mesmo saber, é o melhor “Túnel do Tempo” desde Red Son. 

Acho que agora ganhei sua atenção, não? 

Bom apetite. 
A seguir, os pratos principais dos Chefs Escapistas.

domingo, 5 de julho de 2015

"And here's to you, Mrs. Rob... Kopetski?!"

Barbara "Barb Wire" Kopetski é um petardo de seu tempo. Egressa dos quadrinhos noventistas, a personagem de Chris Warner dividia seu tempo entre a gerência de um bar decadente, frequentado por tipos duvidosos, e como caçadora de recompensas. Barb tinha seu lugar numa fictícia 2ª Guerra Civil norte-americana ao qual, para o bem de ambos os seus negócios, tentava se manter neutra. No filme homônimo de David Hogan, um ex-amante a contata, suplicando-lhe que o ajude a escoltar até uma zona segura uma pacifista que poderia mudar os rumos do conflito



A película, claro, é uma bobagem e seu realizador tão limitado¹ quanto (im)possível, mas a introdução de dois minutos com a Senhorita Kopetski embalando uma pole dance hipnotizante ao som de Word Up, do Korn, dificilmente não ficaria marcada no imaginário dos marmanjos proto-sexistas da época. Se existe uma sequência live-action que poderia ilustrar com maestria todo o tratamento diferenciado conferido às mulheres noventistas dos quadrinhos mainstream, não há dúvidas que o seu vídeo é este.

¹ Antes de Barb Wire, o maior feito de Hogan fora a direção de segunda unidade em Batman Eternamente, de Joel Schumacher. Precisa dizer mais? 

Em tempo... 

A Dark Horse acaba de relançar a personagem e a opção do capista regular da série...
 ...tem as iniciais "AH!".

sexta-feira, 3 de julho de 2015

O Limite do Humor

Há cerca de um mês, a DC Comics publicou uma minissérie semanal intitulada de Convergência. Caso pretendas lê-la, o que efusivamente não recomendo, sugiro que pule algumas linhas para evitar o azedume do que vou lhe contar. No clímax da saga em questão, um punhado de super-heróis volta no tempo e evita o esfacelamento do Multiverso ocorrido em Crise nas Infinitas Terras, obliterando, pelo menos no nível simbólico, toda e qualquer relevância que o monumental trabalho de Marv Wolfman e George Pérez um dia tivera.

Se esse foi o presente de trigésimo aniversário da obra, prefiro não pensar no que farão no quadragésimo. Se tu gostas da Crise original, acredito que, tal como esse Escapista aqui, talvez não tenhas apreciado – ou sequer compreendido – essa solução mirabolante de Jeff King para resgatar a continuidade Pré-Flashpoint. Ou, vá lá, tornar mais claro o que de fato ocorreu com personagens populares dos “Velhos 52” como, por exemplo, Wally West.

Por que estou falando sobre isso? Porque, para que faça algum sentido, a exemplo do quadrinho supracitado, O Exterminador do Futuro: Gênesis precisa também implodir pilares de sua estrutura narrativa pré-estabelecida, inclusive, dos “doisfilmes canônicos de James Cameron. Quer dizer, é o caminho fácil tomado por quem não tem paciência alguma para se lidar com especificidades cronológicas, muito embora tal percepção esteja escondida em campo aberto, travestida como homenagens a franquia. O que novamente nos remete a Crise e a “celebração” tacanha de seu natalício, isto é, trazendo-a novamente à tona só para depois cancelar sua existência.

Tenho a convicção que toda a ranhetice advinda do casting questionável, das sequências requentadas de ação e até das boas ideias a exemplo do envelhecimento natural da carne que reveste o T-800, tornam-se pequenas depois que o espectador utiliza um ou dois neurônios para tentar racionalizar a profetizada virada de mesa na trama dos Connors e seu patriarca, Reese. Senti-me tão decepcionado com o que estava testemunhando que, acredite ou não, em dado momento fiquei comparando comigo mesmo o que seria menos idiota.

Aliás, mesmo a busca por reinvenções e inversões de paradigmas esbarra na elíptica dicotomia do velho à mercê do novo presente nos três primeiros Exterminadores. Quer dizer, um humano/autômato velhomas não obsoleto? Será?! – se insurgindo contra um antagonista moderno e implacável, estando em jogo o futuro do Messias ou, no caso de Gênesis, garantir o acasalamento¹ dos genitores (?!).


Por outro lado, sinto que o lobby negativo por parte de Cameron e Schwarzenegger, em comum acordo, sabotou o que poderia ser esse T5, isto é, uma continuação de Salvação, apresentando, quem sabe, com mais contundência a máquina do tempo e, por que não, até mesmo a utilização do Sargento William Candy, aproveitando-se, inclusive, da idade avançada do ator austríaco. Mas tu perguntas, quem diabos seria esse Sargento Candy? Em Rebelião das Máquinas, uma cena removida creditava a esse militar o molde utilizado para a linha de montagem original dos T-800.

Contudo, em livros do universo expandidosim, existe um! –, a aparência do robô teria vindo de um agente da CIA chamado Dieter Von Rossbach. Esse personagem foi apresentado na trilogia de romances imaginada como sequência de T2, e inédita no Brasil. 

Exercício de imaginação à parte, como Cameron disparou, Gênesis é “oficialmente” o terceiro filme da saga e, portanto, desde já, o fecho de uma trilogia que só pode ser comparado com o incomparável

¹ Sobre isso, pergunto agora aos leitores escapistas: qual é o limite do humor? Será que o Terminatorverse comporta algo tão escrachado quanto Gênesis ou o padrão que deveria ter sido seguido seria o alívio cômico sutil e natural de Julgamento Final, por exemplo? 

Vou mais longe, a idade me deixou cínico ou o que se vê em T5 é sim hilariante? Sério, quando ouvi a esmagadora maioria dos presentes na minha sala de cinema entregues a um coro de gargalhadas, comecei a cogitar que o problema era comigo. Será?

Teve quem defendeu o indefensável... Achei fofo.